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Habitat é o ambiente natural de uma espécie animal ou vegetal. O lugar onde se vive.


Habitat é um conceito usado em Ecologia que inclui o espaço físico e os factores abióticos que condicionam um ecossistema, e por essa via determinam a distribuição das populações de uma determinada comunidade. O homem há séculos que não habita em habitats naturais, i.e. constrói para si habitats artificiais, à excepção de algumas zonas remotas e perdidas da chamada civilização. Viveu primeiro em grutas, e debaixo de árvores, inserido em pequenas populações de indivíduos. A construção das primeiras cabanas, ou de habitações palafitas, ainda quando vivia apenas da caça, ou já quando deu os primeiros passos como agricultor, constituiu uma primeira artificialização da sua casa e do seu meio. O seu poderoso cérebro conseguiu todavia que o seu quadro mental guardasse para si sempre um elo que considerava essencial com o mundo natural. Este elo permaneceu sempre forte, sobretudo enquanto durou a sua ligação aos campos e à agricultura, que até há cerca de dois séculos era a sua principal actividade, fonte de riqueza e sustento.


Este elo primordial resistiu a tudo – à construção das primeiras grandes casas, vilas e cidades, à expansão da raça humana e das várias civilizações pelas 5 partes do mundo. No entanto, num período de tempo muito curto, nos últimos 100 anos, este equilíbrio alterou-se, e alterou-se profundamente. Apesar de algumas zonas verdes com pouco significado, as grandes cidades constituem gigantescos habitats artificiais da grande maioria da raça humana. A paisagem rural cada vez mais se constitui como uma espécie de ajardinamento. As florestas que restam estão a desaparecer e os rios a ficar cada vez mais poluídos. Mais uma vez o poderoso cérebro do homem acode a este estado de coisas, tentando melhorá-las, e atenuando a mágoa do enfraquecimento do seu elo com a Mãe Natureza, mas basta percorrer uma estrada de província de noite para ver os milhares de pequenas luzes do território já ocupado por milhões de pessoas.


O crescimento do habitat artificial tornou-o um organismo cada vez mais absorvente e complexo. Mais gente obriga a menos espaço individual por pessoa, muitas casas mas mais pequenas, mais agrupadas, em prédios mais altos. Nesta marcha do ser individual para o anonimato impessoal as casas já não são o que eram – uma família, um destino. Foram-se os luxos antigos – espaços e móveis que percorreram os tempos, recordações individuais, marcas pessoais de identidade. Os luxos modernos são luxos de equipamento, como numa nave espacial, a informática, o plasma, os jogos e “networks” de computador, a “cozinha laboratório”, o mobiliário estereotipado de série mas muito caro. As casas e escritórios foram deixando de ter uma relação “selectiva” com a natureza envolvente, i.e. aproveitando os benefícios do meio natural, como a luz e o calor da radiação solar, ou a brisa fresca do vento, e simultaneamente protegendo-se contra os excesso do clima - para cada vez mais se fecharem sobre si mesmos numa postura de “exclusividade” – em que o contacto com o ambiente exterior é evitado, sendo as necessidades de conforto conseguidas através de sistemas mecânicos, artificiais, como o ar condicionado e a iluminação artificial.


Este processo de “exclusividade” contribui fortemente não só para enfraquecer a nossa relação com a natureza, excluindo-a das nossas vidas, mas também é, por exemplo, responsável por um acréscimo muito considerável do consumo de energia a nível mundial – que por sua vez está na origem do aquecimento global. Mas o homem parece – e vai – recusar-se a dar os passos finais deste processo, a abdicar demasiado da sua ligação fundamental e primeira à natureza. Existe hoje um vasto corpo de informação científica que não só confirma a necessidade deste elo vital, mas também propõe estratégias de actuação, amplamente validadas, e necessárias a um desenvolvimento sustentável. Pouco a pouco vão sendo implementadas e respeitadas directivas que visam dar mais valor à flora e fauna restantes, proteger as grandes áreas incultas e pouco habitadas, promovidas a Áreas Protegidas, não só porque recordam as antigas imagens da natureza mas também pelo papel essencial dos espaços verdes no combate ao aquecimento global.


As noções de “Arquitectura Sustentável” ou “Bioclimática” têm vindo a ser valorizadas nesta última década, dando origem a edifícios de concepção “selectiva” ou “passiva”, geradores eficazes de conforto, de ligação com a natureza, por oposição ao habitat “exclusivo” – que sabemos ser na realidade desconfortável, inumano e energívoro. Longe de estar derrotado o homem adquire progressivamente uma dimensão mais ética do seu lugar entre todas as vidas deste planeta, cada vez mais a grande casa comum.O objetivo prioritário da arquitectura bioclimática, por vezes também designada por “arquitectura solar”, é a minimização do consumo energético para manutenção do conforto ambiental dos edifícios, recorrendo ao uso de estratégias de design passivo, i.e. reduzindo a necessidade de utilização de meios mecânicos de climatização ou iluminação através de uma sábia adaptação do edifício ao contexto climático local.


Muitas das estratégias de design passivo, como ventilação natural, o uso da inércia térmica, sombreamento, orientação solar, etc. são no fundo uma adaptação de técnicas seculares a exigências contemporâneas. Este saber, com algumas excepções, foi sendo progressivamente posto à margem da prática e do ensino da arquitectura desde a implantação do movimento moderno. É contudo importante frisar novamente que houve casos de excepção – na génese de muitos dos projectos de grandes arquitectos modernistas como Lloyd Wright ou Le Corbusier estiveram preocupações de ligação do edifício ao meio natural – resolvidas com recurso ao design passivo, em soluções esteticamente muito criativas.


A arquitectura no quadro de uma conceção bioclimática passa sempre por uma análise aprofundada do contexto climático local. No caso de Portugal é fácil adivinhar uma grande diversidade de soluções de design bioclimático – dada a variabilidade do nosso clima (traduzida em parte e por exemplo, pela nossa arquitectura popular). A aplicação apropriada de muitas destas estratégias de design, na sua maioria amplamente conhecidas há décadas, pode-se resumir em duas palavras: boa arquitectura. A arquitectura bioclimática desenvolve-se num quadro ideológico de sustentabilidade global. Neste sentido, o processo de concepção integra ainda questões ligadas ao impacto ambiental e socio - económico do edifício nas suas várias fases de existência. Por exemplo, o controle na selecção e utilização de materiais que necessitam de muita energia para serem produzidos, como o alumínio, o aço, o plástico ou o vidro, dando preferência a materiais de produção mais económica, como a terra (ex. construção em adobe, tijolo, taipa), alguns tipos de betão, ou madeira (de florestas sustentáveis); a preferência pelos recursos materiais e humanos locais, promovendo o desenvolvimento regional e diminuindo o impacto ambiental dos transportes. A ponderação sobre o tempo de vida estimado do edifício, de modo a prorrogar a necessidade de nova construção, é outro factor-chave. E espero pelo tempo em que a utilização de termos como “Arquitectura Bioclimática” ou “Arquitectura Sustentável” desapareçam dos cartazes à beira de estrada a anunciar empreendimentos duvidosos, ou, melhor ainda, espero que desapareçam de todo do vocabulário da nossa profissão.

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